domingo, fevereiro 08, 2009

Em Tormes, a filosofar sobre o paradoxo da escola de hoje

Em “A cidade e as serras”, já no conforto idílico de Tormes, Zé Fernandes sacudia a “espessa crosta de ignorância” com que saíra “do ventre de Coimbra”. Era noite e contemplava, ao lado do urbano Jacinto, o magnífico céu estrelado. Deixou ir o seu discurso atrás do pensamento arrebatado e discorreu quase em êxtase sobre a essência e o valor do Saber: “porque decerto cada Mundo possui o seu Descartes, ou o nosso Descartes os percorreu a todos com o seu Método, (…) o grande Penso logo existo. Portanto todos nós, Habitantes dos Mundos, às janelas dos nossos casarões, além nos Saturnos, ou aqui na nossa Terrícula, constantemente perfizemos um acto sacrossanto que nos penetra e nos funde – que é sentirmos no Pensamento o núcleo comum das nossas modalidades, e portanto realizarmos um momento, dentro da Consciência, a Unidade do Universo!” Zé Fernandes pára por um momento e interpela Jacinto, que quer sentir junto de si naquela expressão genuína de empatia entre o Homem e a Natureza, unidos pelo Saber. Mas Jacinto, molemente aconchegado na sua “pachorra e facúndia”, “rosnou: - Talvez… Estou a cair com sono”.

Poderá ser esta situação ficcionada pelo Patrono da escola em que dou aulas, a Escola Secundária Eça de Queirós, em Lisboa, uma imagem adequada para configurar um dos maiores paradoxos das escolas de hoje em dia: a que opõe a natural curiosidade humana pelo conhecimento e saber à geralmente apregoada desmotivação dos alunos para a aprendizagem na escola, nos currículos formais habituais.

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