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domingo, outubro 04, 2015

Psicologia - Frase da semana, 04OUT15: QUE BELEZA E SAÚDE GANHAMOS (OU PERDEMOS) NOS GINÁSIOS

Psicologia - Frase da semana, 04OUT15: QUE BELEZA E SAÚDE GANHAMOS (OU PERDEMOS) NOS GINÁSIOS

A tua beleza / é essa luta de sombras / é o sobressalto da luz / num tremor de água / é a boca da paixão / mordendo o meu sossego. (Mia Couto, in 'Raiz de Orvalho', poema No Teu Rosto)
John William Waterhouse, "Eco e Narciso", 1903
Vou regularmente ao ginásio - mais à sauna que ao ginásio -, de há algum tempo a esta parte, para "perder músculo" e suar valentemente, a libertar as toxinas. Cruzo-me com tanta gente de quem gosto verdadeiramente, sobretudo entre alunos actuais e antigos.
No grande ginásio e no balneário são tantos que eu vejo dedicados à composição de bebidas energéticas, de cremes, de loções, de cheiros: e de tatuagens. Depilações dos peitos e das pernas e tatuagens. Tantas tatuagens! Algumas deles, na verdade, lindas composições artísticas. Sim, algumas são mesmo muito bonitas. São, mas...
Mas há qualquer coisa que me aflige naqueles tantos cuidados consigo mesmos...
Só agora consegui encontrar num livro de Mia Couto, que comecei a ler há mais de um ano, interrompi e agora retomei, as palavras que ajudam a comunicar o meu pensamento sobre estas coisas dos corpos que nos ginásios se espremem na lufa-lufa da beleza cada vez mais apurada:
«Tu me olhavas enquanto, na cama, eu espalhava os cremes de beleza pelo corpo. Eram demasiados, queixavas-te: uma loção para o rosto, outra para o pescoço, uma para as mãos, outra ainda para o contorno olhos. Foram inventados como se cada porção de mim fosse um corpo em separado e sustentasse uma beleza própria. Para os vendedores de cosméticos já não basta que cada mulher tenha o seu corpo. Cada uma de nós tem vários corpos, existindo em autónoma federação. Era o que tu dizias tentando demover-me.
Perseguida pelo medo da velhice, deixei envelhecer a nossa relação. Ocupada em me fazer bela, deixei escapar a verdadeira beleza, que apenas mora no desnudar do olhar. O lençol esfriou, a cama se desaventurou. Esta é a diferença: a mulher que encontraste aí em África, fica bela apenas para ti. Eu ficava bela para mim, que é um outro modo de dizer: para ninguém.
[...] Acedemos ao pecado para fugir do inferno. Aspiramos à asa do desejo para, depois, tombarmos sob o peso da culpa.»
Assim posta fora do contexto esta longa citação pode ser tomada como - outra vez! - expressão da visão masculina egocêntrica. Sim, não deixará de o ser... mas o que eu quero realçar é que cada vez mais este "pecado das loções e dos cosméticos" é bi-sexual (ou assexuado), que se prolonga depois na relação a dois, de vida marital, que cada vez mais tarde - cada vez mais nunca - desemboca na família com prole.

domingo, junho 08, 2014

Psicologia - Frase da semana, 09JUN14: DE QUE COR ÉS TU?

Psicologia - Frase da semana, 09JUN14: DE QUE COR ÉS TU?

Amanhã concluirei o relacionamento formal com os meus alunos do 12.º ano deste ano escolar. É dia de dar notas. De Setembro até à sexta-feira passada, falámos muito, pensámos muito; e, sobretudo, criámos entre nós e com outros fora de nós, em Portugal e no Mundo inteiro - sim, no Mundo inteiro! -, muitas coisas de valor, de muita Cultura e Humanidade.
Este pequeno excerto da entrevista de Agualusa e Mia Couto, da edição do Público de hoje, tem muito a ver com as descobertas que fizemos e com o olhar sobre as Pessoas e o Mundo que inventámos entre nós e partilhámos com os outros.
Simbolicamente, esta entrevista chegou no momento certo! É que no decorrer da semana o próprio Mia Couto nos disse que podemos contar com ele para as aulas de Psicologia no próximo ano!
Na entrevista, a jornalista pergunta a Agualusa: "Os adultos não vêem?"
Agualusa responde: Nalguns casos, vêem à medida que envelhecem. As crianças vêem o evidente. Costumo contar uma história da minha filha, quando era bem pequenina. Uma senhora fez-lhe uma pergunta muito idiota. "De que raça és tu?" Ela não entendeu. Não tinha sequer o conceito de raça. A senhora tentou corrigir a pergunta, errando ainda mais. "De que cor és tu?" A minha filha olhou muito espantada. 

"Mas não vês que sou uma menina? As meninas são pessoas. As pessoas têm cores diferentes. A minha língua é vermelha, os meus dentes são brancos, o meu cabelo é castanho."
Temos todas as cores. É preciso uma criança de quatro anos para dizer o óbvio.

sábado, março 15, 2014

A representação mental das relações interpessoais

http://fanart.tv/fanart/music/1582a5b8-538e-45e7-9ae4-4099439a0e79/
artistbackground/ben-harper-4e4950d6d392c.jpg

Psicologia - Frase da semana, 17mar14, "A representação mental das relações interpessoais"

"Certa vez, alguém perguntou a Ben Harper, um famoso músico americano:
-
Ouvimos dizer que você tem um novo baterista na banda. Diga-me uma coisa: ele é negro?
E Harper respondeu:
- Não sei, nunca lhe perguntei."

Mia Couto, Pensatempos (textos de opinião), 2005. Editorial Caminho, p. 89. 

"Once Ben Harper, a famous American musician, was asked: 
- We have heard you have a new drummer in your band. Tell me one thing: is he black? 
And Harper replied: 
- I do not know, I never asked him. "

sábado, novembro 02, 2013

Mia Couto (?) - O Dedo na Ferida

UI!... QUE TEXTO!...
Que a(s) fonte(s) me perdoe(m), reproduzo-o integralmente, tentando trazer algum esclarecimento!

Um dia isto tinha que acontecer - Mia Couto (?)

NOTA PRÉVIA: Este texto já anda na Internet há mais de 2 anos; e não é seguro que seja da autoria de Mia Couto. Será de Maria dos Anjos Polícia? (http://assobiorebelde.blogspot.pt/2011/03/geracao-rasca-nossa-culpa.html) Seja de quem seja, faz-nos pensar. Pessoalmente, revejo-me na generalidade das reflexões que nele são apresentadas.
http://expresso.sapo.pt/manifestacao-geracao-a-rasca-chega-ao-
rossio-com-mais-de-200-mil-pessoas-fotos-e-video=f637298

Um dia isto tinha que acontecer. Está à rasca a geração dos pais que educaram os seus meninos numa abastança caprichosa, protegendo-os de dificuldades e escondendo-lhes as agruras da vida. Está à rasca a geração dos filhos que nunca foram ensinados a lidar com frustrações. A ironia de tudo isto é que os jovens que agora se dizem (e também estão) à rasca são os que mais tiveram tudo. Nunca nenhuma geração foi, como esta, tão privilegiada na sua infância e na sua adolescência. E nunca a sociedade exigiu tão pouco aos seus jovens como lhes tem sido exigido nos últimos anos.

Deslumbradas com a melhoria significativa das condições de vida, a minha geração e as seguintes (actualmente entre os 30 e os 50 anos) vingaram-se das dificuldades em que foram criadas, no antes ou no pós 1974, e quiseram dar aos seus filhos o melhor. Ansiosos por sublimar as suas próprias frustrações, os pais investiram nos seus descendentes: proporcionaram-lhes os estudos que fazem deles a geração mais qualificada de sempre (já lá vamos...), mas também lhes deram uma vida desafogada, mimos e mordomias, entradas nos locais de diversão, cartas de condução e 1.º automóvel, depósitos de combustível cheios, dinheiro no bolso para que nada lhes faltasse. Mesmo quando as expectativas de primeiro emprego saíram goradas, a família continuou presente, a garantir aos filhos cama, mesa e roupa lavada.

Durante anos, acreditaram estes pais e estas mães estar a fazer o melhor; o dinheiro ia chegando para comprar (quase) tudo, quantas vezes em substituição de princípios e de uma educação para a qual não havia tempo, já que ele era todo para o trabalho, garante do ordenado com que se compra (quase) tudo. E éramos (quase) todos felizes. Depois, veio a crise, o aumento do custo de vida, o desemprego, ... A vaquinha emagreceu, feneceu, secou. Foi então que os pais ficaram à rasca. Os pais à rasca não vão a um concerto, mas os seus rebentos enchem Pavilhões Atlânticos e festivais de música e bares e discotecas onde não se entra à borla nem se consome fiado. Os pais à rasca deixaram de ir ao restaurante, para poderem continuar a pagar restaurante aos filhos, num país onde uma festa de aniversário de adolescente que se preza é no restaurante e vedada a pais. São pais que contam os cêntimos para pagar à rasca as contas da água e da luz e do resto, e que abdicam dos seus pequenos prazeres para que os filhos não prescindam da internet de banda larga a alta velocidade, nem dos qualquercoisaphones ou pads, sempre de última geração. São estes pais mesmo à rasca, que já não aguentam, que começam a ter de dizer "não". É um "não" que nunca ensinaram os filhos a ouvir, e que por isso eles não suportam, nem compreendem, porque eles têm direitos, porque eles têm necessidades, porque eles têm expectativas, porque lhes disseram que eles são muito bons e eles querem, e querem, querem o que já ninguém lhes pode dar!

A sociedade colhe assim hoje os frutos do que semeou durante pelo menos duas décadas. Eis agora uma geração de pais impotentes e frustrados. Eis agora uma geração jovem altamente qualificada, que andou muito por escolas e universidades mas que estudou pouco e que aprendeu e sabe na proporção do que estudou. Uma geração que colecciona diplomas com que o país lhes alimenta o ego insuflado, mas que são uma ilusão, pois correspondem a pouco conhecimento teórico e a duvidosa capacidade operacional.

Eis uma geração que vai a toda a parte, mas que não sabe estar em sítio nenhum. Uma geração que tem acesso a informação sem que isso signifique que é informada; uma geração dotada de trôpegas competências de leitura e interpretação da realidade em que se insere. Eis uma geração habituada a comunicar por abreviaturas e frustrada por não poder abreviar do mesmo modo o caminho para o sucesso. Uma geração que deseja saltar as etapas da ascensão social à mesma velocidade que queimou etapas de crescimento. Uma geração que distingue mal a diferença entre emprego e trabalho, ambicionando mais aquele do que este, num tempo em que nem um nem outro abundam. Eis uma geração que, de repente, se apercebeu que não manda no mundo como mandou nos pais e que agora quer ditar regras à sociedade como as foi ditando à escola, alarvemente e sem maneiras. Eis uma geração tão habituada ao muito e ao supérfluo que o pouco não lhe chega e o acessório se lhe tornou indispensável. Eis uma geração consumista, insaciável e completamente desorientada. Eis uma geração preparadinha para ser arrastada, para servir de montada a quem é exímio na arte de cavalgar demagogicamente sobre o desespero alheio. Há talento e cultura e capacidade e competência e solidariedade e inteligência nesta geração? Claro que há. Conheço uns bons e valentes punhados de exemplos! Os jovens que detêm estas capacidades-características não encaixam no retrato colectivo, pouco se identificam com os seus contemporâneos, e nem são esses que se queixam assim (embora estejam à rasca, como todos nós). Chego a ter a impressão de que, se alguns jovens mais inflamados pudessem, atirariam ao tapete os seus contemporâneos que trabalham bem, os que são empreendedores, os que conseguem bons resultados académicos, porque, que inveja! que chatice!, são betinhos, cromos que só estorvam os outros (como se viu no último Prós e Contras) e, oh, injustiça!, já estão a ser capazes de abarbatar bons ordenados e a subir na vida. E nós, os mais velhos, estaremos em vias de ser caçados à entrada dos nossos locais de trabalho, para deixarmos livres os invejados lugares a que alguns acham ter direito e que pelos vistos - e a acreditar no que ultimamente ouvimos de algumas almas - ocupamos injusta, imerecida e indevidamente?!!!

Novos e velhos, todos estamos à rasca. Apesar do tom desta minha prosa, o que eu tenho mesmo é pena destes jovens. Tudo o que atrás escrevi serve apenas para demonstrar a minha firme convicção de que a culpa não é deles. Haverá mais triste prova do nosso falhanço? Mia Couto