domingo, julho 19, 2015

A ordem social é da Humanidade, igual para todos; ou é diferente de uns para os outros?

Psicologia - Frase da semana, 19JUL15: A ORDEM SOCIAL É DA HUMANIDADE, IGUAL PARA TODOS; OU É DIFERENTE DE UNS PARA OS OUTROS?


«A burocracia surge-me como um fenómeno dos bons
tempos. [...] em toda a parte, e em cada abrigo, vai-se estabelecendo uma espécie de ordem, de disciplina. [...] Deve fazer parte da nossa natureza.»
(anónimo, "Um Mulher em Berlim, Asa, 2014, p. 23)
Esta ideia - trazida a escrito por uma senhora alemã, berlinense que testemunhou a chegada das tropas russas à capital alemã em 1945 -, é abundante em ingredientes para ser tomada como verdadeira, correcta e absoluta; mas... mas eu "desconfio" dela, já digo porquê. Para já, por que razões se tornará fácil tomá-la como disse - verdadeira, correcta, absoluta:
1) é escrita por alguém que deseja manter-se anónimo; quer dizer, não persegue a fama, logo, é uma pessoa honesta.

2) o relato é verdadeiro, pertence a um dos momentos mais infelizes da História Moderna, que ocupa ainda hoje uma posição de grande destaque no pensamento das culturas humanas; e é de estudo obrigatório nas escolas de muitos países do Mundo.

3) é escrito por uma mulher, que crenças estereotipadas e preconceituosas põem como mais sincera e verdadeira do que os homens, como se da mãe boa, sincera e frontal se tratasse. Diz o prefácio do livro: «Sem o testemunho da autora, a crónica dos nossos tempos, que tem sido escrita quase exclusivamente por homens, seria parcial e incompleta».

4) é o pensamento de alguém que está olhos nos olhos com a morte; ou seja a tragédia em que participa, fruto de outro pensamento preconceituado e estereotipado, dá-lhe uma aguda consciência do sentido da vida, dos valores e dos sentimentos de humanidade.

5) é o pensamento de alguém cujo relato nos faz deduzir que é uma pessoa boa e culta.

Pois, pode ser que sim... mas eu, como já dei a entender, ainda não estou convencido. Por agora ainda "desconfio" deste pensamento:
- não tenho certezas sobre este assunto, nem alguma vez, até agora, me preocupei em ter. Como, entretanto, fui confrontado com ele (no fundo, um assunto sobre a essência e a especificidade da Natureza Humana) pelo livro da anónima autora, não posso deixar de me interrogar sobre o que, afinal, penso sobre isto; e se, numa aula, um aluno me perguntasse a minha opinião sobre o assunto, o que lhe responderia eu?
Ora, se a autora foi pressionada pelas circunstâncias da vida pessoal com que se confrontava para pensar como veio a deixar escrito, eu também penso ligando o assunto/ a questão/ o tema às circunstâncias actuais da minha vida pessoal, ou melhor, das circunstâncias da vida em sociedade em que, quer queiramos, quer não, os meios de comunicação social, agressivamente, nos trazem, sem que seja possível escapar a essa pressão informativa quase propagandista.
Quais são essas circunstâncias actuais? São a Grécia, a Alemanha; os resgates e os perdões das dívidas; os povos que trabalham, os que são preguiçosos; os que são solidários e os que são implacáveis; e a regras que se cumprem, as que não se cumprem, mas que - dizem uns mais que outros; e todos de maneiras diferentes - nunca deveriam deixar de ser cumpridas.
No fundo, num pensamento ainda muito sincrético, pouco elaborado, pergunto-me, tendo em mente a expressão de ódio e de intransigência dos líderes políticos da Alemanha e outros dirigentes políticos do Norte da Europa em relação aos gregos, se o que está em causa não será a mais abismal incapacidade de tais líderes e dirigentes europeus entenderem que outros grupos humanos pensem de maneira diferente sobre as regras e a ordem social.
Será que a autora anónima, possivelmente tão alemã quanto Merkel e Schäuble, toma a nuvem por Juno e projecta na Humanidade Universal um certo tipo de organização social que se enraizou na genética cultural de apenas um ou alguns poucos povos do Mundo?
E nestes (des)encontros entre o que os outros são e o que fazemos, nas nossas mentes, eles serem nós todos vamos tecendo os novelos do grande (des)concerto do Mundo. No fundo, se eu não me entende com os outros, como posso esperar que os outros se entendem comigo?
A luta da minha circunstância não é, como tantos líderes europeus parecem pensar, entre a ordem e a desordem (ou não-ordem), em sentido absoluto; a mim, parece-me ser entre uma certa ideia de ordem (dominante, a alemã) e outras ordens.(1)

A citação de todo o parágrafo do anónimo autor:
«A burocracia surge-me como um fenómeno dos bons tempos. A verdade é que todas as repartições são dissolvidas logo que começam a cair os primeiros estilhaços de granada. (A propósito, agora está tudo muito calmo. Uma calma inquietante.) Deixámos de ser governados. E, no entanto, em toda a parte, e em cada abrigo, vai-se estabelecendo uma espécie de ordem, de disciplina. Quando a minha casa foi bombardeda, reparei como todos partiam ordeiramente, os que haviam estado soterrados, os feridos e os traumatizados. Também aqui na cave do prédio prevalece a força da ordem, um espírito que dirige, organiza e comanda. Deve fazer parte da nossa natureza. A humanidade já terá funcionado assim na Idade da Pedra. Seres gregários, instinto de sobrevivência da espécie.»

(1) Será esta "força da ordem", como lhe chama a autora, a explicação da espantosa recuperação da sociedade alemã depois das duas Grandes Guerras? Mas, para que isso fosse possível, não terá sido muito importante outra concepção da ordem social e do "gregarismo" entre os Povos, como, por exemplo, os gregos deram mostram quando colaboraram no perdão da grande dívida alemã depois de uma dessas guerras?

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