sábado, abril 09, 2011

O lado lunar (Obrigado, Carlos Tê!) do empreendedorismo e da criatividade

A Ana Gil, a Carla Andrino e eu próprio participámos hoje num encontro muito interessante sobre desenvolvimento vocacional, em Braga. Mais uma vez, foi uma bela ocasião de companheirismo muito saboroso, muito alegre, entre os elementos do grupo dos 21.
Os conceitos dominantes da sessão científica foram a criatividade e o empreendedorismo. O nome mais citado foi o de Thomas Edison. Ele e as suas próprias citações: Genius is one per cent inspiration, ninety-nine per cent perspiration; ou I have not failed. I've just found 10,000 ways that won't work.
Hoje em dia, por todo o lado, o entusiasmo com a criatividade e com o empreendedorismo é enorme! Ora acontece que Thomas Edison, especialmente ele, é um autor que nos deve pôr a pensar sobre o lado lunar dos comportamentos que têm a ver com a criatividade e o empreendedorismo. Fernando Blázquez, por exemplo, na sua interessante e muito curiosa obra "Histórias do mundo sem as partes chatas" (da Academia do Livro, 2010), diz o seguinte, na página 327:
"Mas se há um inventor com fama de pirata, esse é, sem dúvida, Thomas Alva Edison (1847-1931). Hoje sabe-se que a sua equipa incluía um grupo de detetives que se infiltrava no Departamento de Registo de Patentes. Depois, ele e os técnicos a seu cargo limavam os defeitos das ideias mais interessantes, e aperfeiçoavam-nas para as apresentar como ideias originais. Tesla [Nikola Tesla (1856-1943), que não viveu o suficiente para ver o Supremo Tribunal dos Estados Unidos atribuir-lhe a propriedade da patente da rádio que, afinal, glorificou Marconi] trabalhou para Edison, até não aguentar mais apropriações ilícitas das suas invenções e estabelecer-se por conta própria."
Não consigo evitar a vertigem de ser irónico ou mordaz sugerindo que se recorde uma outra citação também atribuída a Edison: "To invent, you need a good imagination and a pile of junk."
No encontro em Braga cheguei a falar na dimensão... ou traço... ou componente do perfil... ou... ou...ou... predador ou predadora do empreendedorismo. E depois falou-se de ética; mas ficou por discutir se a ética é exterior ao indivíduo e tem o condão de conseguir conter a intensidade predadora do (meu) empreendedor, ou se a ética é (mais) uma dimensão ou traço do empreendedor, assim justificando a tendência de considerar que o empreendedorismo e a criatividade são conjuntos de comportamentos ou estilos pessoais. Numa e noutra perspetiva, fica-se com a ideia que a criatividade e o empreendedorismo fazem (exclusivamente) parte do lado bom da vida. Será assim mesmo?...
Na verdade, nos tempos que correm, da mais pura selvajaria política e económica (seguramente com muito empreendedorismo na sua base), disseminada por toda a parte, receio que a investigação que nós, os psicólogos - e outros especialistas das ciências humanas -, entusiasmados com as nossas investigações e os nossos estudos, percamos a perspetiva adequada dos fenómenos - quiçá mesmo, alguma ética - e, de cabeça tão enfiada na terra quanto a avestruz, mais do que servir o Conhecimento Científico ou o Bem-Estar, a Saúde Mental e o Desenvolvimento Pessoal Harmonioso, estejamos a servir interesses que manipulam interesseiramente estas coisas que acabei de enumerar com letras maiúsculas. E manipulam-nos a nós!
Acredito que negar que o empreendedorismo contem a um nível micro, individual, psicológico, um lado lunar é correr o risco de escotomizar a realidade e comporta consequências graves na tramitação dos resultados da investigação psicológica e sociológica para a esfera da educação, nas escolas e nas famílias (e, porque não também, nas empresas?); e para a formação geral dos cidadãos.

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